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Sexo, mentiras e politicagem – estudos flagram insetos enganando parceiras durante o acasalamento e tentando subir desonestamente na hierarquia da colônia. (Escrito pelo repórter Ricardo Bonalume Neto e publicado no jornal Folha de São Paulo de 16/01/2005, caderno Mais!, página 9. Negritos adicionados)
Quando um macho convida uma fêmea para comer, costuma haver uma segunda intenção: sexo. Machos de muitas espécies animais dão os chamados “presentes nupciais” para as fêmeas na forma de um petisco durante o ritual de acasalamento. Ela ganha uma refeição, ele aproveita para copular. Quanto melhor a comida, mais longa a atividade sexual. Mas alguns machos malandros enganam as fêmeas com falsos presentes, que nem mesmo são comestíveis. O sexo não é tão demorado. Mas o macho teve uma chance de passar adiante seus genes.
Dois pesquisadores no Reino Unido, Natasha LeBas e Leon Hockam, da Universidade de Saint Andrews, fizeram experimentos com diversos tipos de presentes dados por moscas carnívoras. Basicamente, eles retiravam o presente genuíno de comida por outro menor ou por um sem valor – uma pequena bola de algodão. E descobriram que, apesar da cópula ser mais longa com um pedaço de comida maior, não havia muita diferença no tempo de sexo com um presente genuíno, mas menor, ou com o algodão, não comestível. O artigo descrevendo os achados foi publicado na última edição da revista científica “Current Biology”.
“Eu especularia que dar presentes às fêmeas durante a cópula provavelmente surgiu por acaso, quando machos se acasalando com parceiras carregavam uma presa que eles próprios estavam comento” diz Lebas. “Esses machos provavelmente consguiram fazer sexo por mais tempo e transferir mais esperma quando a fêmea começou a comer a presa”, afirma a bióloga, hoje na Universidade da Austrália Ocidental.
Essa dupla vantagem seletiva – o macho copula por mais tempo, a fêmea ganha uma refeição de graça – possivelmente fez com que as fêmeas passassem a fazer sexo só com machos que trouxessem presentes.
E como surgiu o comportamento do macho enganador?
“Eu diria que dar presentes nupciais sem valor surgiu quando machos passaram a dar coisas mais fáceis de se obter, mas que mesmo assim permitiam um tempo suficiente de cópula, pois a fêmea esperava receber comida, e vai tentar comer o objeto por algum tempo. Por isso, dar presente sem valor só pode evoluir em espécies que já dão presentes de comida”, declara LeBas, enfatizando tratar-se ainda de uma hipótese.
“Uma explicação alternativa seria que dar o presente inútil surgiu em espécies que não davam comida, com o presente servindo apenas como um sinal sexual. Parece ser algo difícil de começar sem a entrega primeiro de comida, mas não quer dizer que não possa ter surgido dessa maneira”, diz a bióloga.
Polícia
O macho malandro em geral escapa sem punição. Não se pode dizer o mesmo de que comete “crimes” entre insetos sociais, como abelhas e formigas. A pena de morte pode significar a decapitação do infrator.
“Sociedades de insetos também experimentam conflitos internos e pesquisas têm cada vez mais mostrado que o policiamento é importante para resolvê-los”, escreveram os pesquisadores Francis Ratnieks e Tom Wenseleers na revista científica “Science” (http://www.sciencemag.org/).
Ratnieks, da Universidade de Sheffield, Reino Unido, está vindo ao Brasil nesta semana para fazer uma palestra sobre o tema em São Paulo, além de aproveitar para pesquisar abelhas brasileiras, notadamente aquelas sem ferrão, estudadas por Vera Imperador Fonseca, da USP.
Segundo Ratnieks, conflitos em sociedades – humanas ou de insetos – surgem por causa de diferentes interesses de indivíduos. No caso dos insetos, os conflitos envolvem a reprodução. Abelhas operárias podem querer colocar ovos, que em geral terminam destruídos por outras operárias; ou mais fêmeas que o ideal podem querer se transformar em abelhas rainhas.
“Um inseto passaria duas vezes mais cópias dos seus genes se a colônia criar um indivíduo para o qual ele tenha 50% de parentesco, como um filho, em contraste com apenas 25%, no caso de um irmão. O inseto não tem consciência, mas a seleção natural favorece insetos que façam isso, da mesma maneira que favorece os que podem sobreviver melhor, ou coletar comida melhor”, afirmou Ratnieks à Folha.
Na abelha comum (Apis mellifera), o policiamento preventivo é bem feito. Abelhas rainhas são criadas em casulos maiores do que as operárias. Como as operárias adultas dão mais comida para as larvas que estão em casulos maiores, é possível controlar o número de futuras rainhas.
Já na abelha mexicana sem ferrão da espécie Melipoma beecheii, rainhas e operárias têm o mesmo tamanho. Como não há policiamento preventivo, cerca de 20% das larvas viram rainhas, e a maioria termina morta pelas trabalhadoras.
As rainhas da abelha sem ferrão brasileira da espécie Schwarziana quadripunctata são maiores que as operárias e também são criadas em células maiores. No entanto, algumas das larvas de operárias conseguem iludir o sistema e se transformam, nos seus casulos menores, em rainhas anãs. Mas a maioria termina morta pelas sempre vigilantes operárias policiais.
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